Em um mundo onde a pressa e a superficialidade muitas vezes ditam as regras, é fácil perder de vista a essência das coisas. No campo do paisagismo, essa tendência se manifesta na forma como muitos profissionais e clientes abordam o projeto de espaços exteriores: uma preocupação excessiva com a estética e a ornamentação, com a instagramização da realidade, em detrimento da experiência humana e da funcionalidade do espaço.
Mas o que aconteceria se, em vez de nos concentrarmos em preencher os espaços com plantas e objetos, passássemos a projetar os vazios? Se, em vez de nos preocuparmos com a aparência, nos concentrássemos em criar experiências significativas e transformadoras para as pessoas que habitam esses espaços?
Essa é a proposta do paisagismo espaçoceptivo, uma abordagem que redefine a forma como pensamos e praticamos o paisagismo. Inspirada na visão da arquitetura como projeto de vazios habitáveis, essa abordagem nos convida a repensar o papel do paisagista e a abraçar uma nova forma de criar espaços exteriores.
A Essência do Paisagismo: Projetar Vazios, Não Preencher Espaços
Para compreendermos a essência do paisagismo espaçoceptivo, é fundamental fazermos a distinção entre duas abordagens distintas: o paisagismo como preenchimento decorativo de espaços e o paisagismo como projeto de vazios.
Na primeira abordagem, o foco está em preencher os espaços com plantas, mobiliário e outros elementos decorativos, buscando criar uma estética agradável e atraente. O paisagista, nesse caso, atua como um decorador de exteriores, especializado na escolha de plantas ornamentais, preocupado em combinar cores, texturas e formas para criar um visualmente agradável.
Na segunda abordagem, o foco está em projetar os vazios, ou seja, os espaços que serão habitados e vividos pelas pessoas. O paisagista, nesse caso, atua como um arquiteto de exteriores, preocupado em criar espaços funcionais, confortáveis e significativos, que atendam às necessidades e desejos dos usuários.
A diferença entre essas duas abordagens é sutil, mas profunda. Enquanto o paisagismo como preenchimento de espaços se concentra na aparência, o paisagismo como projeto de vazios se concentra na experiência. Enquanto o primeiro busca agradar aos olhos, o segundo busca tocar o coração e a alma.
O Papel do Paisagista Espaçoceptivo: Um Arquiteto de Experiências
O paisagista espaçoceptivo é, antes de tudo, um arquiteto de experiências. Sua missão não é simplesmente criar jardins bonitos, mas sim projetar espaços que inspirem, emocionem e transformem as pessoas, seus comportamentos e a compreensão dos lugares.
Para isso, ele precisa dominar uma série de habilidades e conhecimentos que vão além da botânica e da jardinagem. Ele precisa ser um observador atento do comportamento humano, um conhecedor profundo das necessidades e desejos dos usuários, um intérprete de seu comportamento natural e intuitivo.
O paisagista espaçoceptivo precisa compreender a forma como as pessoas percebem e interagem com o espaço, levando em consideração fatores como a escala, a proporção, os eixos, os fluxos, a identidade e o significado dos espaços. Ele precisa ser capaz de criar espaços que promovam o não só o bem-estar e a segurança, mas a construção de significados e de narrativas simbólicas.
As Ferramentas do Paisagista Espaçoceptivo: Plantas como Elementos de Construção
No paisagismo espaçoceptivo, as plantas deixam de ser meros elementos decorativos e passam a ser utilizadas como verdadeiros materiais de construção. Assim como o arquiteto utiliza paredes, pisos e tetos para definir e organizar os espaços, o paisagista utiliza frequentemente plantas para delimitar, direcionar, proteger e conectar os diferentes ambientes.
As plantas podem ser utilizadas para criar barreiras visuais e acústicas, proporcionando privacidade e conforto. Elas podem ser utilizadas para direcionar o fluxo de pessoas, guiando-as através do espaço e convidando-as a explorar diferentes áreas. Elas podem ser utilizadas para criar microclimas, protegendo as pessoas do sol, do vento e da chuva. Elas são também pisos, paredes e tetos…
Além disso, as plantas seguem sendo utilizadas para estimular os sentidos, despertando emoções e memórias. As cores vibrantes das flores, o perfume suave das ervas aromáticas, o som relaxante das folhas ao vento, a das folhas… todos elementos seguem importantes no impacto sensorial do projeto.
O Paisagismo Espaçoceptivo como Ferramenta de Transformação Social
O paisagismo espaçoceptivo não se limita a criar espaços bonitos e agradáveis. Ele pode ser utilizado como uma ferramenta de transformação social, promovendo a inclusão, a sustentabilidade e a qualidade de vida nas cidades.
Bons projetos geram bons espaços, que espaços que promovem a interação social, valorizam a cultura e a história local, e contribuem para o fortalecimento da identidade e do senso de pertencimento da comunidade – que resultam na criação de espaços exteriores mais humanos, sustentáveis e transformadores.